terça-feira, 3 de setembro de 2024

Os magos em AD&D2e eram fracos demais?

Me lembro de quando criança e adolescente, jogando o imortal AD&D, sempre me incomodar com a relativa fraqueza da nobre classe dos Magos (lembrando que na época só havia Guerreiros, Magos, Clérigos, Bardos, Paladinos, Rangers, Ladrões e Druidas, e as várias combinações multiclasse permitidas pelas regras).




A classe dos Guerreiros era a que possuía menos restrições: podiam usar tudo o que era arma e armadura - mas em compensação eles não tinham nenhuma habilidade especial. Era só porrada e tática.

Os Clérigos não podiam usar armas cortantes (havia exceções conforme a fé de cada clérigo, mas o basicão era esse mesmo), e tinham acesso às Magias Divinas, as quais tinham um caráter mais de suporte (cura e proteção), havendo poucas ofensivas (ex: "Causar ferimentos leves"). Os clérigos também conseguiam afastar mortos vivos com o Poder da Fé, o que era uma baita ajuda, dependendo da aventura (e não era nada incomum aparecerem pelo menos uns esqueletos nas aventuras)

Os Ladrões tinham restrições de armadura - podiam usar no máximo a combinação "Corselete de Couro e Escudo" - o que fazia sentido, pois precisavam ser ágeis e discretos, o que não seria possível com uma armadura de placas de metal pesada e tilintante. E tinham as habilidades de ladrão,  que iam melhorando conforme subiam de nível.

Não lembro especificamente das restrições dos Bardos, Druidas e Rangers, mas deviam ser algum meio termo entre ladrão e guerreiro. Salvo engano, não havia magias para druidas, eles usavam as Divinas, dos clérigos. 
Os Rangers eram basicamente "Ladrões da floresta". 
Os bardos eram basicamente "Ladrões que tocam instrumentos",  tinham aquele lance legal de "saber um pouco de tudo" e podiam lançar algumas magias (em algum post futuro, quem sabe, eu detalho mais um pouco sobre Druidas, Rangers e Bardos e faço uma análise focada no jogador de nível 1).

Os Paladinos eram um meio termo entre Guerreiro e Clérigo, eram como se fossem  clérigos que podem usar espada.


Já os magos, ponto focal deste post, sofriam as maiores restrições. 
Vejamos abaixo (tirei as informações da ficha do personagem "Morganth - o Misterioso", do kit First Quest de AD&D2e):

- Só pode usar "Manto", e nenhuma armadura. Ou seja, salvo algum eventual bônus de destreza ou algum efeito de um item mágico, a Categoria de Armadura do Mago estava "fixa" em 10.

- Só pode usar Bordão, Adaga e Cajado como armas. Ou seja, o maior dano possível é 1d6, fora eventuais danos mágicos (eu sempre dava um jeito de o mago começar pelo menos com um "Bordão +1" ou um "Cajado+1" ou "Adaga+1", e justificava isso na backstory do personagem - a adaga mágica era para rituais, o bordão ou o cajado foram presentes do mestre dele, etc.)

- Dados de vida: 1d4 (uma das piores restrições,  pois praticamente qualquer monstrinho conseguiria matar um mago com apenas 1 golpe. Para contornar isso, eu geralmente deixava o jogador usar 1d6 como dado de vida, ou deixava rolar 2d4 ou até 3d4)

- E agora veremos, a meu ver, a pior restrição: a quantidade de magias permitidas por nível! 

Vejamos:

Nível 1: 1 magia do 1º círculo

Nível 2: 2 magias do 1º círculo

Nível 3: 2 magias do 1º círculo e 1 do 2º;

E conforme o livro do Jogador, a progressão de magias vai assim:
 
Nível 4 - 3 do 1º, 2 do 2º círculo - 5 magias no total

Nível 5 - 4 do 1º, 2 do 2º, 1 do 3º círculo - 7 magias no total 

Nível 6 - 4 do 1º, 2 do 2º, 2 do 3º círculo - 8 magias no total

Nível 7 - 4 do 1º, 3 do 2º, 2 do 3º e 1 do 4º círculo - 10 magias no total

Nível 8 - 4 do 1º, 3 do 2º, 3 do 3º e 2 do 4º círculo - 12 magias no total.

Nível 9 - 4 do 1º, 3 do 2º, 3 do 3º, 2 do 4º e 1 do 5º círculo - 13 magias no total.

Nível 10 - 4 do 1º, 4 do 2º, 3 do 3º, 2 do 4º e 2 do 5º círculo - 15 magias no total.

Nível 11 - 4 do 1º, 4 do 2º, 4 do 3º, 3 do 4º e 3 do 5º círculo - 18 magias no total.

Nível 12 4 do 1º, 4 do 2º, 4 do 3º, 4 do 4º, 4 do 5º e 1 do 6º círculo - 21 magias no total.

Nível 13 5 do 1º, 5 do 2º, 5 do 3º, 4 do 4º, 4 do 5º e 2 do 6º círculo - 25 magias no total.

Nível 14 5 do 1º, 5 do 2º, 5 do 3º, 4 do 4º, 4 do 5º, 2 do 6º e 1 do 7º círculo - 26 magias no total.

Nível 15 5 do 1º, 5 do 2º, 5 do 3º, 5 do 4º, 5 do 5º, 2 do 6º e 1 do 7º círculo - 28 magias no total.

Nível 16 5 do 1º, 5 do 2º, 5 do 3º, 5 do 4º, 5 do 5º, 3 do 6º, 2 do 7º e 1 do 8º círculo - 31 magias no total

Nível 17 5 do 1º, 5 do 2º, 5 do 3º, 5 do 4º, 5 do 5º, 3 do 6º, 3 do 7º e 2 do 8º círculo - 33 magias no total.

Nível 18 5 do 1º, 5 do 2º, 5 do 3º, 5 do 4º, 5 do 5º, 3 do 6º, 3 do 7º, 2 do 8º e 1 do 9º círculo - 34 magias no total.

Nível 19 5 do 1º, 5 do 2º, 5 do 3º, 5 do 4º, 5 do 5º, 3 do 6º, 3 do 7º, 3 do 8º e 1 do 9º círculo - 35 magias no total.

Nível 20 5 do 1º, 5 do 2º, 5 do 3º, 5 do 4º, 5 do 5º, 4 do 6º, 3 do 7º, 3 do 8º e 2 do 9º círculo - 37 magias no total.

Resumindo:
Nível / Número de Magias
1 / 1
2 / 2
3 / 3
4 / 5
5 / 7
6 / 8
7 / 10
8 / 12
9 / 13
10 / 15
11 / 18
12 / 21
13 / 25
14 / 26
15 / 28
16 / 31
17 / 33
18 / 34
19 / 35
20 / 37

Note que o máximo de magias que um mago pode fazer por dia (no nível 20) é 37, o que é um bom número. E o máximo de magias de qualquer círculo são 5, sendo que nos círculos mais altos esse limite é menor. 

Agora vamos analisar as magias do 1º círculo (conforme encarte de magias arcanas que vinha com o kit First Quest - porque a lista do livro do jogador é bem mais longa), para descobrirmos o que de fato um mago de nível 1 era capaz de fazer:

- Enfeitiçar pessoas (talvez a mais útil, mas provavelmente não funcionaria com um monstro realmente perigoso. Pode ser útil em missões urbanas, para conseguir informações - segredos, localização de itens importantes, etc. - ou até mesmo trazer um NPC para a dungeon para servir de isca para um monstro perigoso)

- Detectar Magia (útil para encontrar, talvez uma armadilha mágica,  ou para saber que um item era mágico)

- Expandir/Encolher (a versão encolher pode ser útil para enfraquecer um monstro forte, tornando-o mais fraco, ou talvez possa ser útil usar a versão Expandir para tornar o PJ mais forte do grupo ainda mais forte. Considero que seria uma boa escolha de magia, para um mago nível 1)

- Queda suave (pode salvar o grupo de uma queda fatal, mas acho muito específica, não sei se alguém no nível 1 escolheria essa para ser a sua única magia)

- Cerrar portas (pode salvar o grupo de algum monstro ou grupo de monstros que os esteja perseguindo, mas não imagino alguém escolhendo esta para ser sua única magia)

- Identificação (útil somente em uma cidade, em algum lugar tranquilo fora da dungeon, pois demora 8h para ser preparado. O encarte não diz para que serve, mas creio que seja para identificar itens mágicos)

- Luz (útil para iluminar uma área escura ou para marcar um monstro - essa magia pode ser fixada em uma criatura)


- Dardos Místicos (uma das poucas magias de ataque disponíveis aos magos do nível 1. O nome soa bem, mas o dano também não é lá essas coisas, e não acho uma opção tão boa para quem só tem 1 magia para escolher. Dano: 1d4+1)

- Ler magias (permite ao mago ler textos mágicos,  mas tem o inconveniente de disparar armadilhas do tipo "runas explosivas". Acho específico demais e creio que só seria escolhido se o jogador soubesse que iria encontrar algum tomo mágico para ler, e se tiver mais do que apenas 1 magia para usar)

- Escudo Arcano (cria uma barreira invisível de defesa para o mago, mas só defende a frente, e não os flancos ou a retaguarda, e também não é perfeita: não bloqueia totalmente os ataques, simplesmente  reduz a categoria de armadura do mago para 3, ou seja, um pouco melhor que uma cota de malha)

- Toque Chocante (talvez a mais útil do ponto de vista ofensivo no primeiro círculo, mas mesmo assim só causa 1d8+1 >> talvez seja bom para o nível 1, mas lembre-se que o mago só poderá usá-la 1 vez ao dia).

- Sono (talvez uma das mais úteis. O mago pode fazer um monstro dormir e com isso dar a chance para o restante do grupo dar o golpe final, ou pelo menos machucar bastante o monstro)

Conferi o que está escrito sobre Magos no Livro do Jogador, e vi que ainda há a restrição adicional de só poder ser humano, elfo ou meio-elfo, e valor mínimo de inteligência igual a 9. 

(Não vou comentar a respeito das "subdivisões" Especialista e Ilusionista - talvez em algum post futuro, quem sabe).

Após esta breve análise, chego à conclusão (já amplamente conhecida) que os magos foram pensados para serem personagens de suporte tático, e não da linha de frente

Talvez em níveis mais altos eles se tornem máquinas de matar monstros, mas nos primeiros níveis eles estão no grupo para dar apoio (Abrindo e fechando portas, iluminando lugares escuros, escurecendo lugares claros, encontrando e identificando itens mágicos, etc.) Só são realmente poderosos a partir do nível 7, por aí.

Se eu estivesse jogando como mago de nível 1, qual magia eu escolheria? Depende da aventura, e claro que seriam usadas várias, pois as aventuras geralmente duram mais do que um dia.

Se eu achasse que a aventura envolveria um confronto com muitos monstros, talvez eu usasse Sono para colocar (se possível) vários monstros dormindo de uma só vez.

Se eu achasse que havia o risco de o grupo sofrer uma queda em um buraco (ex: explorando uma caverna) eu usaria Queda Suave.

Se fosse em um lugar como um castelo abandonado, uma mansão abandonada, uma galeria subterrânea,  etc. talvez fosse útil usar Luz em algum momento, para iluminar alguma sala escura. ou para marcar determinado monstro (o livro diz que a magia se fixa em um monstro que não passe no teste de resistência). 

Pode ser útil também usar Cerrar Portas, caso seja necessário que o grupo se esconda em uma sala isolada de um castelo / mansão / dungeon para descansar e se recuperar.

E vocês, caros leitores, como usavam seus magos? 
Comentem aí!

6 comentários:

  1. Eu cresci no D&D imerso em house rules, então não faz muito sentido comparar com o sistema original. Mas o grupo acreditava que o mestre tinha predileção por magos e todo mundo achava que o mago era a classe mais poderosa. hehehehe
    Naqueles tempos, nossas house rules do mago era que o escudo arcano era passivo e funcionava sempre e sem carga de magia. Além disso, o mago não precisava preparar magia, ele podia soltar qualquer magia conhecida. Inclusive quando fui jogar baldur's gate original, pela primeira vez, estranhei muito isso de preparar magia.

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    1. Obrigado pelo comentário, Sonhonauta.
      Eu também sempre joguei muito mais com "house rules" do que com as regras oficiais mesmo. Aliás, me pergunto se realmente era necessário haver regras oficiais tão detalhadas assim!
      Essa regra de preparar a magia eu também nunca usei, nos meus jogos era sempre no automático, a não ser que fosse uma magia muito difícil (digamos, um ritual para invocar uma criatura poderosa). Fora isso, as magias fáceis tipo "dardos místicos" eram na hora e as magias um pouco mais fortes (relâmpago, bola de fogo) eu até colocava uma regra de 1 turno para "carregar". E como eu joguei muito quando era criança / pré-adolescente, lá pelos meus 10 a 12 anos, só eram usadas magias de ataque e defesa, e nunca as que estão no livro pelo "roleplay"!
      Essa regra do escudo arcano permanente também é uma boa. Isso é uma coisa que os videogames de RPG acertam.

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  2. Realmente, não há como comparar o mago de AD&D com a "metralhadora arcana" de Pathfinder ou muito menos com os "morteiros mágicos de MMO" de D&D 4 e 5, mas ainda assim, não acho os magos da 2a edição fracos. Eles começam devagar, mas isso em minha opinião é ótimo porque força o jogador a realmente saber usar os recursos que lhe são disponíveis de forma inteligente e criativa (características essenciais para um bom mago). No entanto, à medida em que evoluíam, ficavam notoriamente mais poderosos do que os demais personagens. Era algo merecido, conseguido com muito "suor". Por isso, era na época uma classe tão gratificante, e em algumas mesas, não recomendada para iniciantes.

    Definitivamente, sinto falta daqueles tempos...

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    1. Grato por sua presença, nobre Senhor dos Ventos!

      Realmente, a sensação de ir subindo o nível do mago e eventualmente tornar-se um personagem poderoso, com muito suor, é muito boa!
      O problema é que para alcançar isso era necessário ter uma mesa de jogadores dedicados, o que para mim era difícil. Geralmente esse começo fraco do mago desencorajava os jogadores a escolherem essa classe e, para os poucos que escolhiam, acabava desencorajando até mesmo de jogar.

      Por isso que eu acho que os cantrips até que foram uma boa idéia da 5ª edição. Mas é claro que sempre precisa ter limite, para não virar "metralhadora" de magia.

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    2. Sim, na minha época, tínhamos algumas concessões que ajudavam o mago no início, especialmente no AD&D. Eles podiam começar conhecendo três magias a mais e nos tesouros, não era raro encontrar pergaminhos de 1o nível. Os cantrips em D&D 5e para mim são exagerados porque escalam muito de poder, a ponto de tornarem muitas magias de 1o e até 2o nível sem sentido após o 5o nível do personagem. Mas esse recurso usado de forma mais moderada, como era em Pathfinder I, era positivo.

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    3. É, acho que realmente temos que escolher: ou temos cantrips, ou facilitamos esse comecinho dos magos (permitindo magias a mais e facilitando encontrar pergaminhos e até varinhas mágicas. Eu facilitava aumentando os pontos de vida - d6 ao invés de d4 - aumentando o número de magias - não lembro quantas, mas devia ser umas 5 - e dando um item mágico para começar - o cajado+1 presenteado pelo mestre, ou uma adaga+1 usada em rituais mágicos. Realmente é mais legal facilitar os primeiros níveis dos magos do que usar cantrips.

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