terça-feira, 8 de abril de 2025

Reinos Esquecidos - Leão

 



Leão foi um reino da Península Ibérica, fruto das Guerras de Reconquista, o qual existiu de 910  até 1230, quando foi absorvido pela última vez pelo Reino de Castela (mas, formalmente, só deixou de existir como "reino" em 1833 - durante todo este tempo os reis da Espanha possuíam, em seus títulos, o de "rei de Leão"!). 

Seu território abrangia o norte de Portugal e o Noroeste da Espanha (em suas constituições atuais).





Sua história foi relativamente breve e muito conturbada, marcada por várias guerras fratricidas - o território de Leão foi alvo de muitas disputas entre herdeiros reais dos reinos de Castela,  Galícia e Astúrias e em diversas ocasiões  de sua história, Leão fez parte do Reino de Castela e do Reino de Galiza.

A origem do reino, ao menos de sua configuração territorial, foi por ocasião da transferência da capital do reino das Astúrias de Oviedo para a cidade de Leão, o que lhe conferiu maior importância política e plantou as sementes do futuro reino. 

Seu primeiro rei foi Garcia I, filho de Afonso Magno, rei das Astúrias. Quando da morte de Afonso Magno, o reino das Astúrias foi dividido entre seus herdeiros, tendo Leão ficado para Garcia, Astúrias para Froila e a Galiza para Ordonho II.



Além das guerras civis entre herdeiros dos tronos ibéricos, o reino de Leão também enfrentou as ameaças dos mouros (dos vários califados e taifas islâmicos da península Ibérica) e até mesmo uma invasão viking: por volta do ano de 968 uma frota de 100 navios noruegueses, liderados por um certo Gundrod (possivelmente um irmão do rei Harald II, da Noruega) se instalou na costa da Galícia e durante três anos saqueou e pilhou diversas cidades, alcançando Compostela e assassinando o bispo Sisnando Menendez, responsável pela defesa da cidade. Os vikings foram finalmente derrotados por um exército trazido pelo Conde Gonzalo Sánchez em 970. Gundrod e seus guerreiros remanescentes foram executados pelo conde após a batalha, e seus navios foram incendiados. Poucas invasões vikings ocorreram depois disso, e nenhuma tão bem-sucedida quanto a Gundrod.


Quanto às guerras contra os mouros, é digno de nota que, em 1085, após um cerco que durou cerca de 2 meses, Alfonso VI, rei de Leão e Galícia, conquistou a cidade de Toledo - esta foi a primeira cidade importante tomada dos muçulmanos no contexto da Reconquista, marcando o começo da expansão territorial dos reinos ibéricos e da retração de Al-Andalus.

Curiosamente, o mesmo Alfonso VI foi quem indicou Henrique da Borgonha (Burgúndia) para ser o Conde de Portugal (na época Portugal era apenas o Condado Portucalense). Henrique foi o pai de D. Afonso Henriques, o primeiro rei dos portugueses e, portanto, "bisavô" do Brasil.


O último rei de Leão, como um reino independente, foi Alfonso IX. Em seu reinado foi fundada a Universidade de Salamanca e as Cortes de Leão, o primeiro parlamento europeu com representação da população comum.

Com a morte de Alfonso IX, seu filho Fernando III, o rei de Castela, invadiu o reino de Leão e o anexou. O povo leonês não aceitou a dominação por Castela, e Fernando III precisou enfrentar alguns anos de revoltas e guerras de secessão. 

Com o passar dos anos, a importância política de Castela foi crescendo e suplantando a de Leão (fato reforçado pelo predomínio da língua Castelhada sobre a língua Leonesa). Entretanto, por muitos anos ainda os dois reinos, embora unidos sob um mesmo monarca, manteriam moedas, leis e parlamentos distintos. Isto durou até a unificação nacional espanhola, na era moderna.

Atualmente, Leão faz parte da Comunidade Autônoma de Castela e Leão, no noroeste da Espanha.

sexta-feira, 21 de março de 2025

Heróis do mundo real - Dom Dinis, rei de Portugal

 



Bisneto de Dom Afonso Henriques, o  fundador de Portugal e primeiro rei dos Portugueses, Dom Dinis foi coroado na tenra idade de 17 anos, se tornando o sexto rei de Portugal e reinado de 1269 a 1325. 

Dom Dinis também faz parte da descendência de outros reis célebres, como Frederico Barba Ruiva e Henrique II, da Inglaterra.

Desde a infância acompanhou seu pai, Dom Afonso III, na condução do reino.

Logo que assumiu o trono demonstrou suas aptidões diplomáticas: fez as pazes com a Igreja Católica e convenceu o rei de Aragão, Pedro III, a conceder a mão de sua filha Isabel (a qual, 343 anos depois, seria canonizada Santa pela Igreja Católica), o que rendeu uma aliança estratégica entre Portugal e Aragão.




Enfrentou uma difícil decisão quando, por ordem do Papa Clemente V (este por sua vez agindo sob pressão do rei Felipe IV, da França), todos os bens da Ordem do Templo deveriam ser confiscados e os cavaleiros templários mortos. Dom Dinis tomou posse de suas propriedades e confiscou seus bens, mas permitiu que os cavaleiros fugissem e, além disso, conseguiu para Portugal um importante benefício: ao invés de entregar os bens confiscados da Ordem do Templo para a Ordem Hospitalária, conforme ditava a ordem de Clemente V, ele os entregou à nova Ordem de Cristo, a qual foi fundada em 1319 em seu reino, tendo sido a primeira ordem militar portuguesa.


O símbolo da Ordem de Cristo. Note que este símbolo foi carregado nas caravelas do Descobrimento e incorporou-se à heráldica portuguesa!


Dinis foi um notório amante das artes literárias, sendo ele próprio compositor de diversas cantigas (137 delas sobreviveram até os dias de hoje!),  o que o fez ficar conhecido pela alcunha de "O Trovador". 

Também é digno de nota que este rei foi o responsável por ter tornado a língua Portuguesa no idioma oficial da corte de Portugal e por ter fundado a Universidade de Coimbra, a primeira universidade portuguesa.

Também foi responsável por importantes reformas agrícolas em seu Reinado, o que lhe rendeu a alcunha de "O Lavrador". Fundou várias aldeias e vilas, incentivando o uso da terra pelo povo, e com isso aumentou a produção agrícola portuguesa.


Dom Dinis reinou durante 46 anos, um longo reinado, próspero e estável, o qual avançou bastante o desenvolvimento de Portugal e, consequentemente, da civilização ibérica. 

O rei faleceu em 1325, aos 63 anos,  uma boa idade para a época.

Seu sucessor foi D. Afonso IV.

sábado, 18 de janeiro de 2025

A popularização de um hobby não necessariamente é benéfica para o hobby

Ao escrever este texto, ele começou como um simples comentário a respeito da faca de dois gumes que foi a popularização dos RPG, com ênfase nas desvantagens (pois afinal este também é um blog de crítica literária). 

Porém, ao longo da escrita, acabou evoluindo para uma pequena reflexão antropológica a respeito de minhas impressões do comportamento da sociedade atual e do rumo que, na minha opinião, estamos tomando. 

Enfim, meus caros 10 leitores, é apenas um breve desabafo sem a pretensão de estar "absolutamente certo a respeito de tudo".


Um breve resumo do que aconteceu com os RPG e com as demais "culturas nerds" nos últimos 15 ou 20 anos
 

A popularização dos jogos de RPG obviamente foi boa para o Gary Gygax e seus sócios, e foi boa também para quem trabalha com RPG (antes deveriam ser bem poucas pessoas trabalhando, e em uma escala artesanal - e hoje em dia RPG é uma indústria multimilionária, sendo que a WoTC deve ficar com uns 90% dos lucros). 

Ou seja, pelo menos foi bom em termos de gerar empregos e dinheiro. No mundo atual isso é importante, feliz ou infelizmente.

E, claro que se não tivesse se popularizado da forma como se popularizou, talvez eu nunca tivesse conhecido os RPG. Há males que vem para o bem, afinal. 

Mas talvez não tivesse sido assim. Talvez o RPG tivesse chegado ao Brasil discretamente através de pequenas livrarias de nicho e eu tomasse conhecimento da mesma maneira. Na realidade, não tem como saber o que teria acontecido se as coisas tivessem sido diferentes!

O que aconteceu com os RPG, especialmente com o D&D, em minha visão, foi o que aconteceu com muitas outras atividades humanas, outrora artesanais: foi "corporativizado" e com isso burocratizado e industrializado, deixando de ser obra de artesãos apaixonados para se tornar um produto padronizado feitos por corporações cinzentas, muitas vezes comandadas por altos-executivos que não se importam com o "produto" que estão vendendo e muitas vezes nem o entendem. 

Aliás, ter virado um "produto" já foi o começo da degradação do RPG. 

No começo era um trabalho feito por artesãos apaixonados, verdadeiros artistas que amavam o que faziam. É notório o "charme artesanal" dos primeiros produtos da TSR (a empresa fundada pelo Gygax, que fez a publicação de D&D). As primeiras capas em preto e branco, os desenhos feitos à mão, aquilo tudo parecia ter recém-saído do porão ou da garagem de alguém (e de fato alguns saíram mesmo!). Algumas ilustrações eram feias, admito, mas o conjunto todo tinha um charme que acho que hoje em dia só persiste nos livros-jogo da série "Fighting Fantasy", e isso porque por algum motivo (provavelmente custos) não resolveram mudar as ilustrações internas dos livros.




As primeiras capas coloridas mantiveram o charme artístico artesanal, e esse espírito foi carregado até a era de AD&D2e, que eu acho que foi o ponto mais "high fantasy" de D&D, e também a fase mais variada, com várias linhas de produtos paralelos - Ravenloft, Dark Sun, Dragon Lance, Greyhawk -. As capas e imagens do interior dos livros melhoraram muito, mas sem perder o "charme artesanal". 

Embora nessa fase a TSR já fosse uma empresa bem maior do que no começo e já com boa popularidade, o RPG ainda era um hobby "de nicho" (ainda é, de certa forma, mas nem tanto - virou parte da "cultura pop") e a editora ainda mantinha o espírito dos artesãos apaixonados  - embora já fossem "produtos", os seus livros ao menos tinham a aura de terem sido produzidos por e para pessoas que gostam de fantasia e RPG.

A partir de D&D 3.0, as coisas foram ficando mais comerciais, e o D&D 5e, bem como seus novos donos, a WoTC, são como se fossem um "fast food" dos RPG - ou seja: fazem produtos padronizados feitos em massa, para consumo da massa -, enquanto  que a antiga TSR era como se fosse a "comida caseira, feita com amor", para ser apreciada por poucos. 

Não nego que o "fast food" também tenha o seu lugar, mas em excesso faz mal! 

Claro que o crescimento do hobby e da empresa trouxe uma maior distribuição e divulgação do mesmo, bem como mais riqueza e empregos, mas ao custo de tornar tudo mais burocrático, padronizado, chato e mais com cara de "produto", fora o medo que toda empresa grande tem que é o de ser criticada e ter sua imagem manchada (e parece que quanto maior a empresa, mais fácil isso fica e mais medrosa ela se torna - em alguns casos chegando às raias da covardia). 

Hoje os jogos de D&D são produzidos por e para pessoas que não são tão fãs de RPG assim - e pelo visto muita gente envolvida na produção nem gosta de D&D

Na verdade, hoje eles são produzidos visando quem gosta de ser associado à "marca D&D", ainda que não jogue quase nada, ou nem leia muito a respeito. O RPG hoje em dia é produzido para "posers" e não para jogadores. Tudo com uma "tinta" de fantasia e aventura,  para disfarçar o miolo de "cash-grabber" que mal se esconde por baixo.

Talvez essa seja uma tendência humana e tenhamos no fundo uma verdadeira sanha por burocracia e controle. Mas é isso o que eu noto na sociedade: uma tendência acelerada a querer controlar tudo, inclusive mediante o sacrifício da própria liberdade

O triste é ver que há sim um número não desprezível de pessoas que aceita perder grandes fatias de suas liberdades e de sua privacidade em troca de migalhas e pequenas conveniências tecnológicas. 

Há um número não desprezível de pessoas que aceita, por exemplo, trocar sua privacidade por uma velocidade um pouco maior de download de vídeos, entregando as chaves de suas vidas privadas para empresas como a microsoft, tesla, etc. e até mesmo para o governo.

E, é importante mencionar: não duvido nem um pouco que se Gary Gygax ou qualquer outro dos autores originais dos anos 70 tentasse vender seu produto hoje para a WotC, muito provavelmente não seriam aceitos. Seriam até mesmo hostilizados na mídia e nas redes sociais.

E se Gygax e seus amigos tentassem trabalhar na WotC, provavelmente seus currículos seriam jogados na lata de lixo pelo departamento de RH da empresa  sem nem ao menos serem lidos (uma curiosidade: bizarramente, o RH é chamado hoje em dia, no Brasil, de "departamento de gente" em algumas empresas - e todo mundo que trabalha sabe que quanto mais "amigável" é o palavreado do discurso de uma empresa, mais maligna ela é, principalmente contra seus funcionários!).

Para terminar o texto, aqui está uma coisa boa da popularização dos RPGs, somada, é claro, à popularização da internet: qualquer um pode criar suas próprias aventuras, sistemas, regras, ilustrações, etc e distribuir ou até mesmo vender. Claro que a maioria do "output" vai ser ruim (cansei de ver lixo em lugares como o  kickstarter e sites semelhantes), mas pode ser que surjam verdadeiras pérolas que eventualmente redimam o hobby!